Diamantina – MG: vinho e história

Vista parcial

Em pleno Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, a produção de vinhos finos de qualidade cresce e já faz parte do cenário vitivinícola brasileiro.

Vinhedos da Quinta do Campo Alegre

Patrimônio Cultural da Humanidade, título concedido pela Unesco, desde o final da década de 90, Diamantina, distante quase 300 km da capital mineira, tem muito mais que um conjunto arquitetônico preservado, noites embaladas por serestas, tapetes arraiolos, histórias sobre Chica da Silva e o fato de ter sido a cidade natal de um dos presidentes brasileiros mais famosos: Juscelino Kubitschek. Lá estão sendo produzidos vinhos finos que a cada dia vem revelando um terroir expressivo.

E o mais interessante é que a produção de uvas e vinhos é tão antiga quanto suas construções históricas. Isso mesmo!

Produção de vinhos na região de Diamantina nos séculos XIX e XX

Um botânico francês, Augustin François César Provensal, conhecido por Saint-Hilaire, viajou pelo Brasil de julho de 1816 a agosto de 1822, período em que fez uma extensa pesquisa sobre plantas, animais e minerais e depois transformou seu aprendizado em livros que retratavam suas descobertas e constatações.

Um dos locais visitados por ele foi o Distrito dos Diamantes, região que detinha uma das riquezas mais desejadas por Portugal.

Mas, além dos diamantes, o lugar tinha entre suas particularidades a plantação de uvas.

“O governo devia encorajar, por todos os meios possíveis, o plantio da vinha e a fabricação do vinho nas regiões do Brasil onde possa haver esperança de sucesso, tais como nesta Capitania de Goiás, no Distrito de Diamantes e na Comarca de Sabará, na Capitania de Minas” é um dos trechos de seu livro “Viagem ao Rio Grande do Sul” que retrata o potencial da região para a produção vitivinícola.

Então, uma coisa que muita gente ainda não sabe é que a história de Diamantina tem também um capítulo para a produção de vinhos produzidos principalmente com as uvas vitis viníferas, que geram vinhos finos.

No século XIX, a localidade já tinha algumas espécies de uvas portuguesas e francesas e a produção do vinho foi principalmente estimulada pelo Clero através do 1º Bispo da região.

Por volta de 1918, a filoxera – doença causada por um ataque de pulgão nas raízes e diversas outras partes da videira –, iniciada na Europa, chegou também aos vinhedos diamantinenses. E aí, a atividade entrou em declínio continuando apenas com a produção de uvas americanas, especialmente a Isabel e a Niágara, por serem resistentes à praga.

Em 1940, a produção de uvas tem um impulso com novos investimentos estimulados pelo Presidente JK com a implantação de uma estação de enologia em Diamantina.

A partir de 1964, com o Golpe Militar, a aplicação de recursos na área foi paralisada levando quase ao desaparecimento dessa prática.

O grande recomeço no século XXI

Outra observação interessante de Saint-Hilaire é a constatação de que em algumas regiões as uvas colhidas no período da seca eram de melhor qualidade do que as colhidas no verão. Isso provavelmente foi mais um indício para, a partir de 2001, o pesquisador Murillo de Albuquerque Regina começar a implantar em vinhedos mineiros a técnica da dupla poda, que consiste inverter o ciclo da planta e colher as uvas no inverno.

A Vitivinicultura  na região de Diamantina foi reiniciada em 2003, isoladamente pelo diamantinense João Francisco Meira, mas foi em 2011, com o apoio do Gov. de Estado de Minas (SECTESD/FEPAMIG) e em ação coordenada pelo Prof. Luiz Eustáquio L. Pinheiro, com a implantação de 13 módulos experimentais, através da adesão de produtores e empresários da região, e com mudas vindas da EPAMIG Uva e Vinho, que a atividade começou uma fase de desenvolvimento e consolidação de sua vocação histórica de produtora de vinhos.

Tudo apontava para um caminho de sucesso: a altitude de variando entre 1.300/1.400 metros, amplitude térmica – dias quentes e noites frias, além do relevo e solo diferenciado.

Em 2015 é criada a AVODAJ – Associação dos Vitivinicultores e Olivicultores
de Diamantina e Alto Jequitinhonha, que tem entre seus objetivos promover o desenvolvimento da vitivinicultura e da olivicultura por meio de ações tecnológicas e gerenciais e de programas cooperativos, presidida até final de 2019 pelo produtor e empresário Leonardo de Andrade e a partir de 2020 pelo produtor e publicitário João Francisco Meira.

Leonardo de Andrade – Presidente da AVODAJ – 2015/2019

Panorama atual

A associação conta com 12 integrantes, que somam cerca de 52 mil vitiviníferas plantadas, distribuídas em 20 variedades, das quais se destacam a Syrah – 51,2%, Tempranillo – 16,4%, Sauvignon Blanc – 12%, Pinot Noir – 5,2% e Malbec – 4,1%, sendo que outras espécies estão sendo testadas.

E buscando um maior aproveitamento da uva, há também a fabricação de grappa ou grapa – destilado produzido a partir da fermentação e posterior destilação do bagaço da fruta.

Em um post de 24 de agosto de 2019, na página “Vinhos Brasileiros” no Facebook, Rogério Dardeau, autor do livro “Vinho Fino Brasileiro”, descreve o vinho La Blanca – um varietal Sauvignon Blanc, produzido pela Vinícola Campo Alegre – com uma expressão geral surpreendente. Mostrando uma cor amarela-esverdeada brilhante. Aromas explosivos, de uma fidelidade comparável aos franceses. No paladar uma acidez marcante que estimula as papilas e prolonga as sensações.

Vinho fino produzido pela Quinta do Campo Alegre

Os vinhos finos produzidos em cada propriedade são únicos, revelando características de um terroir histórico. Vale a pena experimentar! Você vai se surpreender.

Saint-Hilaire, esteja aonde estiver, deve estar contente por ver o que um dia ele percebeu está a florescer.

“Dar-me-ei por feliz se os meus trabalhos puderem ser úteis às ciências a que consagrei toda a minha existência” – Saint-Hilaire.

Vinhedos:

  • Quinta do Campo Alegre
  • Quinta Dalva
  • Quinta da Matriculada
  • Sítio Vale dos Vinhedos
  • Vinhedo Candeia Torta
  • Vinhedo da Toca
  • Vinhedo Fazenda Candeias
  • Vinhedo Fazenda do Sapê
  • Vinhedo Santa Helena
  • Vinhedo Sítio das Lages

Com uma vocação turística fantástica e com a evolução a cada ano da sua produção de vinhos finos, Diamantina começa a escrever mais um capítulo na sua história: o enoturismo.

Regiões produtoras de vinho fino no Brasil

Fonte: Ibravin
Denise Alves Pereira
Autora e editora do livro “Gastronomia: arte e diversão” sobre técnicas para elaboração de cardápios e consultora para negócios de alimentação.
Em breve!

9 comentários em “Diamantina – MG: vinho e história”

  1. Francisco A. Brandão Jr.

    Bom dia Muito feliz em ver está realidade que durante minha infância e juventude percebi e saboreei nas videiras do Palácio da arquidiocese e os cachos da Moscatel do Orlandi entre outras.
    Parabéns em breve após epidemia farei um tour pela regiao.

  2. Francisco A. Brandão Jr.

    Bom dia Muito feliz em ver está realidade que durante minha infância e juventude percebi e saboreei nas videiras do Palácio da arquidiocese e os cachos da Moscatel do Orlandi entre outras.
    Parabéns em breve após epidemia farei um tour pela regiao.

  3. Marcone Jamilson Freitas Souza

    Excelente reportagem, que retrata com paixão a história da produção de vinhos em nossa terra. Diamantina precisa diversificar suas atividades e essa é uma que agrega muito valor. Importante destacar a importância da junção entre dois elementos-chave: empreendedores por paixão e visão pelo negócio e a ciência. Parabéns, Denise!

    1. Denise Alves Pereira

      Oi, Marcone! Concordo com você. Imagina não aproveitar as divisas que o vinho e o enoturismo podem trazer.
      Obrigada pelo retorno.

Deixe uma resposta para Francisco A. Brandão Jr. Cancelar resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *